Descobrimento ou Invenção da América?

Da Redação

Em 12 de outubro de 1492, a expedição liderada por Cristóvão Colombo chegou ao continente americano, dando início a um dos processos históricos mais marcantes da humanidade: a colonização europeia da América. Conhecido tradicionalmente como o "Descobrimento da América", o evento está longe de ser uma unanimidade entre os estudiosos, que hoje preferem problematizar o termo e propor novos olhares sobre seus significados e consequências.

A chegada dos espanhóis ao continente americano está inserida no contexto das Grandes Navegações, impulsionadas pela busca europeia por novas rotas comerciais, sobretudo para acessar as especiarias das Índias. O fechamento da rota terrestre por Constantinopla, após a conquista otomana, e a escassez de metais preciosos na Europa, em especial em Portugal, contribuíram para o investimento em rotas marítimas alternativas.

A exploração do Oceano Atlântico foi, portanto, motivada por interesses econômicos, geopolíticos e religiosos. Portugal foi o pioneiro nessa empreitada, com a conquista de Ceuta em 1415 e a construção de embarcações como a caravela. A Espanha, por sua vez, ingressou nesse processo tardiamente, após unificar-se sob os Reis Católicos e concluir a Reconquista com a expulsão dos mouros em 1492.

Cristóvão Colombo, genovês de nascimento, foi o navegador que apresentou aos monarcas espanhóis um projeto audacioso: alcançar a Ásia navegando pelo Ocidente. Após tentativas frustradas com Portugal, Inglaterra e França, conseguiu, em 1492, o apoio de Isabel de Castela e Fernando de Aragão.

Com três embarcações — Pinta, Niña e Santa María — Colombo partiu de Palos de la Frontera e, após escala nas Canárias, navegou rumo ao desconhecido Atlântico. Após semanas de tensão e expectativa, a terra foi avistada em 12 de outubro, na ilha de Guanahani, hoje parte das Bahamas, que ele rebatizou de San Salvador.

Colombo acreditava estar próximo das Índias, chamando os nativos de “índios”. Mesmo diante de evidências contrárias, ele insistiu em sua tese, vindo a realizar quatro viagens ao continente sem jamais admitir que havia descoberto um “Novo Mundo”.

Na ilha de Hispaniola (atual território do Haiti e República Dominicana), Colombo estabeleceu o primeiro assentamento espanhol: Navidad, deixado sob responsabilidade de 39 homens. Esse núcleo foi destruído após a partida de Colombo, em consequência do comportamento violento dos colonos contra os nativos.

Na segunda viagem, Colombo retornou com 1.200 homens e fundou La Isabela, iniciando a colonização de fato. A chegada dos europeus rapidamente degenerou em conflito, escravidão e massacre. Nativos foram sequestrados, forçados a entregar ouro, escravizados, mortos ou levados à exaustão. A historiadora Marianne Mahn-Lot observa que os espanhóis não desejavam se adaptar ao novo ambiente, preferindo subjugar os nativos para garantir sua sobrevivência.

Poucas décadas depois, milhões de indígenas caribenhos haviam desaparecido em função de massacres, doenças, suicídios e trabalho forçado. O impacto da colonização foi catastrófico e irreversível para as populações originárias.

A expressão “descobrimento da América” é cada vez mais contestada. O termo, consolidado décadas após a chegada de Colombo, é considerado por muitos historiadores uma construção eurocêntrica, pois pressupõe que o continente “passou a existir” apenas após o contato com os europeus. No entanto, a América já era habitada por milhões de pessoas, com culturas, religiões, línguas e estruturas sociais complexas.

O uso do termo “descobrimento” ignora o fato de que os vikings haviam chegado à América do Norte séculos antes, ainda no século X, embora não tenham se estabelecido. Por isso, muitos estudiosos preferem falar em “invasão”, “conquista” ou até “invenção” da América — sendo esta última ideia associada ao fato de que o continente foi reinterpretado e redefinido pelos olhos e interesses europeus.

O 12 de outubro de 1492 representa, de fato, um marco histórico que alterou o curso da humanidade. Entretanto, compreender esse evento apenas como um "descobrimento" é ignorar a complexidade dos impactos sociais, culturais e humanos que dele derivaram. A colonização europeia transformou radicalmente o continente americano — não como um ato de revelação, mas como um processo de dominação, resistência e sobrevivência.

A reflexão crítica sobre o chamado “descobrimento” nos ajuda a compreender melhor não apenas o passado, mas os desafios de reconhecimento histórico, cultural e étnico que ainda marcam a América contemporânea.

 

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