No auge da luta papal pelo poder temporal



por Ilaria La Fauci

O antigo conflito que tem como protagonistas o Estado de um lado e a Igreja do outro tem raízes nos primeiros séculos da afirmação do Cristianismo como religião de Estado com Teodósio, precisamente em 380 com o Édito de Tessalónica. Após a emissão deste documento, alternaram-se governantes que cumpriam totalmente a religião e governantes que a utilizavam como "instrumentum regni". A figura do Papa, ao longo dos séculos, assumiu uma importância cada vez maior, como vigário de Pedro e posteriormente como vigário de Cristo, afirmando a superioridade do poder espiritual sobre o poder temporal; por outro lado, os soberanos, após a submissão inicial testemunhada em parte da Alta Idade Média (em 25 de dezembro de 800 Carlos Magno foi coroado primeiro imperador do Sacro Império Romano pelo Papa Leão III), começaram a tomar as rédeas do reino ou do Império (em 962 o Imperador Otto I emitiu o Privilegium Othonis: a eleição papal deveria ocorrer com o consentimento do imperador, que tem direitos de vigilância sobre Roma), evitando a interferência de outros, à luz das teorias emergentes baseadas em Lei romana.

 

Bonifácio VIII e a polêmica com Filipe, o Belo.

 

No auge deste embate encontramos o Papa Bonifácio VIII e o rei da França Filipe IV, o Belo: estamos no século XIII-XIV, a teocracia pontifícia absoluta, ou a superioridade da Igreja no campo espiritual e temporal dentro da hierarquia do mundo, é incompatível com o aristotelismo, ou a ideia segundo a qual existe uma ordem social independente da Igreja.

 

Uma teoria deve necessariamente dominar a outra: a primeira fase do conflito entre os dois personagens começa a seguir às reivindicações do governante sobre a arrecadação dos dízimos, de modo a utilizá-los para aumentar o sistema organizacional do Reino da França que ele estava iniciando. O pontífice reagiu com a bula papal Clericis Laicos, na qual argumentava que o rei deveria <>: um insulto para Filipe que, com o manifesto Antequam essent clerici, lhe recordou que, antes da Igreja, existia uma ordem social autónoma. O papa continuou a defender que Filipe não pode pôr as mãos em coisas sobre as quais não tem poder, através da bula Ineffabilis, apoiando em vez disso o "plenituto potestatis" do Vigário de Cristo.

 

A segunda fase também começou com uma acusação: ter violado a imunidade eclesiástica ao encarcerar o bispo Saisset para o domínio de Pamiers. Bonifácio não perdeu a oportunidade de recordar a sua superioridade nas esferas espiritual e temporal e que o rei deve ser um bom príncipe cristão: é a famosa bula Ausculta, fili, o próprio documento que Filipe, por sugestão dos seus conselheiros, imediatamente destruído, substituindo-o pelo Scire te volumus para tornar as reivindicações do pontífice perante a França ainda mais contundentes e assustadoras.

 

Bonifácio jogou uma das cartas mais brilhantes com a bula Unam Sanctam: é a afirmação total do poder espiritual como juiz do poder temporal, a união de séculos e séculos de teorias. A parte que os católicos recitam durante o Credo “Creio na Igreja, una, santa, católica e apostólica” é bem conhecida: bem, este documento está ligado precisamente a estas palavras ao apoiar a singularidade e a unidade da Igreja no seu único representante, já que um corpo com duas cabeças seria um monstro. O poder temporal deve ser usado para defender a Igreja desde o exterior, enquanto o poder espiritual vem do interior, e qualquer pessoa que queira ser salva deve submeter-se à autoridade divina do pontífice.

 

Mas a situação tomou um rumo negativo: Filipe juntou-se aos conhecidos adversários de Bonifácio ao poder sobre Roma, os Colonnas, que, juntamente com Guilherme de Nogaret, um delegado francês, entraram em Anagni e colocaram o pontífice em grave perigo, até à sua libertação por pessoas da mesma cidade. Ele morreu e com ele começou o projeto de monarquia papal absoluta com a reforma gregoriana; aqui a Europa caminha para reinos seculares: o poder temporal distanciar-se-á cada vez mais do trono de Pedro.

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